quinta-feira, 20 de março de 2014

Trabalho em empresas de reciclagem de Maceió é realizado sem segurança...

Fiscalização flagrou falta de equipamentos em cooperativas e fábricas.
Cooperados falam que faltam recursos para comprar material de segurança.




As cooperativas e fábricas de reciclagem têm papel significativo na destinação dos resíduos sólidos, diminuindo a agressão ao meio ambiente provocada pela ocupação urbana. O problema é que, em meio ao lixo que é manuseado em muitos desses galpões de reciclagem em Maceió, os catadores ficam expostos a diversos agentes físicos, biológicos e químicos que representam risco à saúde deles.

O problema se agrava porque boa parte deles não utiliza Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). São luvas, botas, máscaras e roupas adequadas que deveriam garantir a segurança, além de prevenir doenças ocupacionais e reduzir acidentes de trabalho.
Há um ano, Rita Costa trabalha em uma cooperativa no bairro da Serraria. Ela disse que perdeu as contas de quantas vezes se feriu com material encontrado no lixo. Sem luvas e de chinelos, ela trabalha seis horas por dia na separação do lixo que chega ao galpão. “As pessoas colocam de tudo no lixo e, algumas vezes, nos deparamos com cacos de vidro e agulhas e acabamos nos machucando”, contou.
A presidente da cooperativa, Maria José dos Santos Lins, explicou que já foram feitos pedidos de EPIs para todos os funcionários. “Estamos aguardando o material e, quando ele chegar, vamos fiscalizar o uso porque tudo que acontece aqui é de responsabilidade da cooperativa. Também vamos ter roupas mais adequadas de trabalho para evitar a contaminação”, informou.
Catadores encontram vidro no lixo que está sendo separado. (Foto: Carolina Sanches/G1)
Catadores encontram vidro no lixo que está sendo
separado. 
Em outra cooperativa de reciclagem na capital, funcionários também trabalham sem EPIs. A catadora e cooperada Célia Maria dos Santos explicou que já foram distribuídas luvas, botas e máscaras, mas que elas se desgastaram e não foram repostas. “Sempre fazem a distribuição, mas demoramos para comprar por falta de dinheiro disponível para isso”, falou.
Sobre os riscos do trabalho sem a devida proteção, ela diz que sabe que está em situação de risco, mas não tem outra alternativa. “Trabalho com cuidado para não me cortar. Já tive em situação muito pior quando era catadora do lixão e sei que os equipamentos vão chegar. Com o tempo, a cooperativa vai conseguir mais material de proteção”, disse.
Fiscalização
A falta de EPIs foi verificada em diversas cooperativas e fábricas particulares de reciclagem de Maceió. Durante uma Fiscalização Preventiva Integrada (FPI), realizada em setembro de 2013 pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA) e pelo Batalhão de Polícia Ambiental, os fiscais flagraram a situação vulnerável dos catadores.
De acordo com o coordenador de endemias da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Celso Tavares, outras ações como a que aconteceu no ano passado vão ser feitas na capital. “A situação verificada foi o primeiro passo para que outras sejam feitas. Também é importante um trabalho de conscientização para os trabalhadores entenderem a importância de estarem seguros quanto a riscos de contaminação e ferimentos”, expôs.
O promotor Alberto Fonseca, do Núcleo de Meio Ambiente, explicou que a ação foi um projeto piloto, mas que terá continuidade. “Vamos buscar recursos junto ao governo para darmos continuidade a este projeto”, disse. Sobre a situação dos catadores, ele disse que foram levantados os principais problemas e as informações remetidas aos órgãos competentes.
Consciência do risco
Em uma empresa particular do bairro do Poço, equipamentos como luvas, botas e máscaras são distribuídos aos trabalhadores que fazem a coleta e separação do lixo. No local são reciclados plástico, alumínio e ferro. Para a catadora Maria Alexandra Silva, que trabalha no local há mais de dois anos, os equipamentos são muito importantes para evitar acidentes.
"Trabalhar com o lixo não é fácil, por isso não posso descuidar. Sempre uso luvas, botas e roupa grossa para fazer a separação. É por isso que nunca me cortei ou tive problema. Só a máscara é que tiro às vezes porque incomoda", disse a catadora.

O gerente do local, Manuel Vieira de Lima, explicou que muitos dos cooperados trabalhavam em lixões e já foram condicionados ao trabalho sem nenhuma proteção. "Nós estamos sempre de olho e orientando os funcionários para que eles não deixem de usar a proteção. Já chegamos a perder alguns deles porque não quiseram trabalhar dessa forma e acabaram abandonando o serviço", contou.
Alguns trabalhadores não deixam de usar equipamentos de proteção. (Foto: Carolina Sanches/G1)Alguns catadores não dispensam equipamentos
de proteção. (Foto: Carolina Sanches/G1)
O médico infectologista Fernando Maia alerta sobre o risco de contaminação durante o manuseio do lixo de forma inadequada. Segundo Maia, as complicações variam desde cortes e machucados a doenças consideradas mais graves como as de pele ou infecções transmitidas por lixo hospitalar. “O tétano é o problema mais grave porque muitos locais lidam com metais enferrujados e material de ferro velho”.
Maia também fala de outras formas de contágio. “Algumas doenças podem vir através dos vetores como moscas, baratas e ratos, que transmitem doenças como dengue, tétano, verminoses, leptospirose e outras”, expôs. O infectologista ainda alerta para a importância de os trabalhadores estarem com o calendário de vacinas em dia.
Direitos trabalhistas
A procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho de 
Alagoas, Virgínia Ferreira,  explicou que, no caso de cooperativas, não há uma lei que obrigue os funcionários a usarem os EPIs. “Nas cooperativas, todos os trabalhadores são responsáveis pela compra dos equipamentos e por questões de risco à saúde”, disse.
Por não terem um proprietário e serem divididas entre os trabalhadores, a cooperativa não possui deveres empregatícios como Pessoa Jurídica. "O ideal é que seja feito um fundo de reserva para resguardar o trabalhador, mas isso deve ser decidido em comum acordo", explicou.
Catadores trabalham sem EPIs na separação do lixo. (Foto: Carolina Sanches/G1)

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